O político moçambicano e ex-candidato presidencial às eleições gerais de 2024, Venâncio Mondlane, submeteu recentemente ofícios formais à Assembleia da República (AR) e à Procuradoria-Geral da República (PGR), com o fito de exigir a instauração de um inquérito rigoroso sobre a gestão do Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável (FNDS), cuja principal bandeira é o controverso programa SUSTENTA.
Segundo noticiou a rede de televisão Miramar, o acto do político, que protagonizou uma campanha presidencial centrada na responsabilização e transparência da governação, visa promover o escrutínio público e institucional de alegadas irregularidades na utilização de recursos públicos, bem como trazer à luz o paradeiro de 800 milhões de dólares americanos anunciados para a reabilitação da Estrada Nacional Número Um (EN1), eixo rodoviário de importância estratégica para a coesão territorial e económica de Moçambique.
“Sair do Debate Teórico para Acções com Efeitos Tangíveis”
Falando à imprensa nacional e internacional, através da MIRAMAR, momentos após a submissão oficial dos ofícios, Mondlane declarou que “a nossa questão fundamental hoje é dar a conhecer que submetemos à Assembleia da República, à atenção da Presidente e das quatro bancadas parlamentares, um ofício que solicita a criação de uma comissão parlamentar de inquérito, para averiguar a probidade na gestão do Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável, cujo derivado mais conhecido é o SUSTENTA”.
Mondlane sustenta que o seu pedido é motivado pela necessidade de fazer uma transição do debate meramente mediático para uma acção legislativa concreta, com impacto real na salvaguarda do erário público e no fortalecimento das instituições democráticas. O ex-candidato alegou que “se temos um fundo público com fortes indícios de má gestão, cuja administração revelou-se potencialmente danosa ao interesse público, então cabe ao Parlamento exercer as suas prerrogativas de fiscalização e verificar se essas percepções generalizadas correspondem ou não à realidade factual”.
Pronunciamentos Ministeriais Aumentam a Gravidade da Situação
Citado pela Miramar, Mondlane, vê na sua análise uma gravidade na situação que segundo diz, ganhou contornos mais preocupantes após o pronunciamento do actual Ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural, que declarou publicamente “não ter conhecimento do projecto SUSTENTA”, pese embora este tenha sido concebido como o principal programa de financiamento rural nos últimos sete anos. A declaração provocou estranheza no seio da opinião pública, dada a envergadura orçamental e política do programa, que absorveu vultosas somas do Orçamento do Estado e de doadores internacionais.
Documentação Substancial Sustenta o Pedido
Para embasar juridicamente e politicamente a sua petição, Venâncio Mondlane anexou uma série de elementos documentais que incluem:
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Relatórios do Tribunal Administrativo referentes aos exercícios económicos de 2020 e 2021;
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Recortes de imprensa nacional com denúncias sobre projectos inconsistentes do FNDS;
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Estudos produzidos por organizações da sociedade civil, entre as quais o Centro de Integridade Pública (CIP) e o Observatório do Meio Rural (OMR).
Segundo Mondlane, estes documentos configuram indícios bastantes de gestão danosa, o que, conforme sublinhou, deve constituir base para a abertura de uma investigação criminal por parte da Procuradoria-Geral da República.
Da Auditoria à Investigação Criminal: PGR Deverá Agir
Mondlane assevera que, em conformidade com os instrumentos legais vigentes, a PGR detém competência para instaurar processos de investigação criminal em casos de má gestão dos fundos públicos. “Se a gestão danosa for confirmada, ela configura um acto criminoso. A Procuradoria tem instrumentos legais para impulsionar um inquérito e determinar se há matéria suficiente para instaurar um processo-crime”, declarou o político.
Invocando o artigo 182 da Constituição da República, Mondlane recordou que a iniciativa de leis e de requerimentos de fiscalização compete exclusivamente aos deputados e às bancadas parlamentares, reforçando, assim, a legitimidade da sua acção junto do órgão legislativo.
O Fundo SUSTENTA e os Outros Projectos do FNDS
Importa referir que o Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável (FNDS), criado para operacionalizar a política de desenvolvimento rural, vai muito além do SUSTENTA. Ele contempla também projectos como:
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MBI Mos Land – voltado à gestão integrada de terras;
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Landscape – focado na restauração ecológica e uso sustentável do solo;
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Red Atalist – que visa a mitigação dos efeitos das alterações climáticas, através da redução de emissões derivadas do desmatamento.
No entanto, a visibilidade e execução do SUSTENTA eclipsaram os demais componentes, tornando-o alvo de críticas por falta de prestação de contas e alegado favorecimento político de alguns operadores.
EN1: A Outra Questão que Não Pode Ser Esquecida
Para além da gestão do FNDS, Mondlane exige esclarecimentos sobre o destino dos 800 milhões de dólares destinados à reabilitação da EN1, cuja degradação compromete a mobilidade de pessoas e bens em todo o país. A ausência de obras significativas ou relatórios detalhados sobre a execução financeira do referido montante levanta sérias preocupações sobre a transparência na execução de infra-estruturas públicas.
“É inadmissível que o principal eixo rodoviário nacional continue num estado de abandono, enquanto se ignora o destino de montantes tão avultados que foram amplamente anunciados ao povo moçambicano”, frisou Mondlane.
Próximos Passos: Expectativa de Respostas das Instituições
A nação observa agora com expectativa a reacção da Presidência da Assembleia da República, que terá de decidir se acolhe ou não a proposta de criação da comissão parlamentar de inquérito. Paralelamente, espera-se uma manifestação formal da Procuradoria-Geral da República sobre a abertura de uma investigação criminal baseada nos elementos indiciários apresentados.
Este episódio reacende o debate sobre governação responsável, a necessidade de reforço dos mecanismos de fiscalização institucional e o imperativo de combater a cultura de impunidade no manuseio de recursos públicos em Moçambique.

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